1)Consumidor deixa seu veículo para
manutenção em oficina mecânica. Após prévio orçamento das peças e da
mão-de-obra, o reparo foi realizado com autorização expressa do consumidor.
Quando da retirada do veículo, o consumidor informou que não pagaria pelo conserto
em razão de sua atual situação financeira. Assistiria à empresa mecânica o
direito de retenção do veículo?
R= Prevalece na doutrina que
existiria o DIREITO DE RENTENÇÃO do credor (oficina) sobre o bem do devedor,
incidindo as disposições da obrigação de restituir coisa certa (art. 238 e 242
do CC), que remetem à regra de benfeitorias úteis e necessárias por possuidor
de boa-fé, sempre que exista melhoramento ou aumento do bem em decorrência de
trabalho ou dispêndio daquele que tem a obrigação de restituí-lo (Art. 1219 do
CC).
Mesmo que o CDC tenha um caráter
protetivo ao consumidor hipossuficiente, isso não lhe confere o direito de
inadimplir suas obrigações. Aprovado pelo consumidor, o orçamento prévio obriga
os contratantes (art. 40, §2º do CDC). Os princípios da boa-fé objetiva, da
força vinculante e da função social do contrato regem a relação consumerista.
Contudo, parcela da
jurisprudência indica que haveria abusividade por constrangimento ou ameaça
(Art. 42 do CDC), já que o direito de retenção por benfeitoria no contrato de
prestação de serviços não é expressamente previsto na legislação civil ou do
consumidor, apenas existindo o dever de pagamento quando findo o serviço (art.
597 do CC). Ao credor apenas restariam as vias ordinárias de cobrança, sendo
vedado o exercício da autotutela.
2)Indivíduo é denunciado por trazer
consigo dez quilos de pasta de cocaína.
O juiz, na sentença, com base no art. 42 da Lei 11343/06, em virtude da
quantidade de droga apreendida, fixa a pena
acima do mínimo legal e ainda rechaça
a aplicação da causa de diminuição do art. 33, §4º do mesmo diploma
legal, muito embora seja o denunciado
primário e portador de bons antecedentes.
Pergunta-se: andou bem o magistrado?
R= A resolução da questão passa pela interpretação do seguintes
dispositivos legais, constantes da LEI Nº 11.343, DE 23 DE AGOSTO DE 2006.
Art. 33:
§ 4o Nos delitos
definidos no caput e no § 1o deste artigo, as penas poderão ser reduzidas de um
sexto a dois terços, desde que o agente
seja primário, de bons antecedentes, não se dedique às atividades criminosas
nem integre organização criminosa.
Art. 42. O juiz, na
fixação das penas, considerará, com preponderância sobre o previsto no art. 59
do Código Penal, a natureza e a quantidade da substância ou do produto, a
personalidade e a conduta social do agente.
A Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal e o Superior
Tribunal de Justiça vinham entendendo que a quantidade de drogas apreendida
fazia presumir a dedicação do agente ao
crime e participação criminosa, razão
pela qual poderia ser considerada nas duas fazes de fixação da pena:
“O art. 42 da Lei 11.343/2006 (“O juiz, na fixação das
penas, considerará, com preponderância sobre o previsto no art. 59 do Código
Penal, a natureza e a quantidade da substância ou do produto, a personalidade e
a conduta social do agente”) pode ser utilizado tanto para agravar a pena-base
quanto para afastar o redutor previsto no art. 33, § 4º, do mesmo diploma
normativo. Com base nessa orientação, a 1ª Turma conheceu parcialmente de
habeas corpus e, nessa parte, o denegou. Aduziu-se que somente a questão
relativa à incidência da causa de diminuição de pena, disposta no § 4º do art.
33 da Lei 11.343/2006, teria sido discutida nas demais instâncias. No mérito,
rejeitou-se, contudo, a tese da ocorrência de bis in idem pela suposta
consideração da quantidade e da qualidade da droga objeto do tráfico também no
exame das condições judiciais. HC 117024/MS, rel. Min. Rosa Weber,
10.9.2013. (HC-117024) “
AgRg no
AREsp 369586 / MT
AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL
2013/0243278-1
Data do Julgamento
17/12/2013
Data da Publicação/Fonte
DJe 03/02/2014
Ementa
AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PENAL.
TRÁFICO ILÍCITO DE DROGAS. FIXAÇÃO DA PENA-BASE ACIMA DO MÍNIMO LEGAL.
ARTS. 59 DO CÓDIGO PENAL E 42 DA LEI N.º 11.343/06.
QUANTIDADE E
QUALIDADE DA DROGA. MOTIVAÇÃO SUFICIENTE. APLICAÇÃO DA
MINORANTE DO ART. 33,§4.º, DA LEI N.º 11.343/06. ART. 42 DA LEI N.º 11.343/06.
QUANTIDADE DA DROGA. PARÂMETRO QUE PODE SER UTILIZADO NA FIXAÇÃO DA PENA-BASE E
NA APLICAÇÃO DA CAUSA DE DIMINUIÇÃO. BIS IN IDEM. NÃO OCORRÊNCIA.AGRAVO
REGIMENTAL DESPROVIDO.
1. O art. 42 da Lei de Tóxicos é expresso no sentido de que
"o juiz, na fixação das penas, considerará, com preponderância sobre o
previsto no art. 59 do Código Penal, a natureza e a quantidade da substância ou
do produto". Assim, é evidente que a majoração da pena-base encontra-se
devidamente fundamentada, em especial, em
Face da qualidade e grande quantidade de droga apreendida:
1.050g (mil e cinquenta gramas) de cocaína.
2. Constata-se que o quantum de aumento em 01 (um) ano de
reclusão, na hipótese, revela-se proporcional e fundamentado, em se
considerando que a pena abstratamente prevista para o delito de tráfico de
drogas é de 05 a 15 anos. Desse modo, não há como,
Diante da ausência de manifesta ilegalidade, reexaminar a
fundamentação apresentada pelo julgador.
3. O Superior Tribunal de Justiça tem jurisprudência
pacificada no sentido de que não se trata de violação ao princípio do ne bis in
idem, a utilização da quantidade e da qualidade da droga apreendida para
fundamentar a majoração da pena-base e a fixação da minorante prevista no art.
33, § 4.º, da Lei n.º 11.343/2006, mas apenas da
utilização da mesma regra em finalidades e momentos
distintos.
4. Agravo regimental desprovido.
A Segunda Turma do
Supremo Tribunal Federal, contudo, decidia de forma diversa, no sentido de que
somente a quantidade de entorpecente não é elemento apto a sinalizar que o
acusado dedicava-se a atividades delitivas,
na ausência outros elementos fáticos :
117185 / MG - MINAS GERAIS
HABEAS CORPUS
Relator(a): Min.
GILMAR MENDES
Julgamento:
05/11/2013 Órgão
Julgador: Segunda Turma
Habeas corpus. 2. Tráfico interestadual de entorpecentes
(art. 33, caput, c/c 40, inciso V, da Lei 11.343/2006). Condenação. Regime
inicial fechado. 3. A Corte estadual, ao julgar o apelo defensivo, manteve a
pena-base no mínimo legal. Na terceira fase, considerando quantidade e natureza
do entorpecente apreendido, aplicou a minorante prevista no art. 33, § 4º, da
Lei 11.343/06 no patamar de 1/6, estabelecendo a pena final em 4 anos, 10 meses
e 10 dias de reclusão. 4. O Superior Tribunal de Justiça, considerando que a
apreensão de grande quantidade de droga é fato que permite concluir, mediante
raciocínio dedutivo, pela dedicação do agente a atividades criminosas, deu
provimento ao recurso especial interposto pelo Parquet e, assim, afastou a
causa de diminuição de pena aplicada pelo Tribunal a quo. 5. Motivação
inidônea. Tão somente a quantidade de entorpecente não é elemento apto a
sinalizar que o acusado dedicava-se a atividades delitivas, pois ausentes
outros elementos fáticos conducentes a essa conclusão. 6. Pedido de aplicação
da causa de diminuição de pena prevista no § 4º do art. 33 da Lei de Drogas, em
seu patamar máximo (2/3). 7. Concessão parcial da ordem para restabelecer o
acórdão proferido pelo TJ/MG (com a minorante aplicada no quantum de 1/6).
Determinação, ainda, ao Tribunal de origem para que, afastando o disposto no
art. 2º, § 1º, da Lei 8.072/90, proceda a nova fixação do regime inicial de
cumprimento de pena, segundo os critérios previstos no art. 33, §§ 2º e 3º do
CP.
Contudo, em decisão do final do ano passado, o Supremo
Tribunal Federal pacificou a divergência entre suas turmas, sufragando a tese
consolidada na Segunda Turma, pela impossibilidade de dupla valoração da
quantidade de droga apreendida;
Quinta-feira, 19 de dezembro de 2013
Quantidade e natureza da droga devem ser analisadas apenas
uma vez na dosimetria
As circunstâncias relativas à natureza e à quantidade de
drogas apreendidas com um condenado por tráfico de entorpecentes só podem ser
usadas, na fase da dosimetria da pena, na primeira ou na terceira etapa do
cálculo, e sempre de forma não cumulativa. Esse entendimento foi adotado pela
maioria dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) presentes à última
sessão plenária de 2013, realizada na manhã desta quinta-feira (19).
Os ministros analisaram dois Habeas Corpus (HCs 112776 e
109193) que discutiam em qual momento da fixação da pena a informação referente
à quantidade e à natureza da droga apreendida em poder do condenado deve ser
levada em consideração. No primeiro caso, o réu foi condenado com base no
artigo 33 da Lei 11.343/2006, por ter sido flagrado com seis gramas de crack.
Já no segundo caso foram apreendidas com o condenado 70 pedras da mesma droga.
No HC 112776, ao fixar a pena, o juiz considerou a
quantidade de droga tanto na primeira fase, quando se calcula a pena-base,
quanto na terceira, momento em que são sopesadas causas que podem aumentar ou
reduzir a pena. Já no HC 109193, o juiz analisou essas circunstâncias apenas na
terceira fase.
Os processos foram encaminhados ao Plenário pela Segunda
Turma da Corte, uma vez que, nas palavras do relator dos HCs, ministro Teori
Zavascki, haveria divergência entre as posições adotadas pelas duas Turmas do
Supremo com relação ao artigo 42 da Lei 11.343/2006. O dispositivo diz que o
juiz, na fixação das penas, considerará, com preponderância sobre o previsto no
artigo 59 do Código Penal, a natureza e a quantidade da substância ou do
produto, a personalidade e a conduta social do agente.
Individualização
Para o relator, usar a informação referente à natureza e à
quantidade drogas em duas fases do cálculo da pena caracteriza, realmente, o
bis in idem (dupla punição pelo mesmo fato). Segundo ele, o juiz pode escolher
em qual momento da dosimetria essa circunstância vai ser levada em conta, mas
apenas em uma fase. Esse fato privilegia, de acordo com o ministro, o poder de
discricionariedade concedido ao juiz na dosimetria, como também o principio constitucional
da individualização da pena.
A discricionariedade de definir o momento de sopesar as
circunstâncias não é novidade na jurisprudência da Corte, salientou o ministro,
lembrando que, no caso, deve-se ter o cuidado, sempre, de evitar o bis in idem.
Para ele, a circunstância referente à natureza e à quantidade da droga
apreendida pode ser usada pelo juiz no momento da dosimetria, tanto na primeira
quanto na terceira fase, desde que não cumulativamente.
O relator foi acompanhado pelos ministros Roberto Barroso,
Cármen Lúcia, Ricardo Lewandowski, Gilmar Mendes e pelo presidente da Corte,
ministro Joaquim Barbosa.
Divergência
A divergência foi aberta pelo ministro Luiz Fux, que integra
a Primeira Turma da Corte e explicitou o entendimento lá adotado. Segundo ele,
considera-se que a análise da circunstância nas duas fases não importa em bis
in idem, uma vez que, na primeira fase, a natureza e a quantidade da droga são
usadas como circunstância judicial e, na terceira, como indicativo do grau de
dedicação ao tráfico.
No caso, estão sendo sopesados, no primeiro momento, a
intensidade da lesão à saúde publica, e, no segundo momento, o grau de
envolvimento do agente com a criminalidade. Segundo Fux, a lei busca punir com
maior rigor quem se dedica ao tráfico e com menos rigor quem se envolve com o
comércio de drogas de maneira eventual.
Seguiram a divergência a ministra Rosa Weber e os ministros
Dias Toffoli e Marco Aurélio.
Ordem
Com base no entendimento adotado, por maioria de votos, os
ministros concederam a ordem no HC 112776, para que o juiz sentenciante proceda
à nova dosimetria, analisando as circunstâncias de natureza e quantidade da
droga apenas em uma das fases do cálculo da pena ao condenado. No HC 109193, a
decisão foi de negar o habeas corpus, por unanimidade.
Como a pacificação da matéria, os ministros ficaram
autorizados pelo Plenário a analisar monocraticamente os pedidos de habeas
corpus que versem sobre o tema. Portanto, não andou bem o magistrado.
Por hoje é só.
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