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sábado, 17 de novembro de 2012

EXECUÇÃO E SENTENÇA CONDENATÓRIA


Autor: LUIZ GUILHERME MARINONI E SÉRGIO CRUZ ARENHART – Resumo  CURSO DE PROCESSO CIVIL V. 3 2010.

EXECUÇÃO E SENTENÇA CONDENATÓRIA

1-  A SENTENÇA SATISFATIVA E A SENTENÇA DEPENDENTE DE EXECUÇÃO

Com as alterações da reforma de 2008, via de regra, o processo executivo passou a ser uma fase do processo de conhecimento, ou seja, é o movimento do sincretismo processual.

O juiz, ao resolver o litígio, nem sempre presa a tutela do direito material. O autor, mesmo no caso de sentença favorável, pode NÃO obter a tutela do direito.

Isto acontece quando a sentença não é suficiente para prestar a tutela do direito ou não é capaz de satisfazer O DESEJO de tutela do autor. A sentença não dar efetivamente o que o autor deseja.

Quando a tutela do direito, PARA SER PRESTADA, precisa do concurso da vontade do demandado ou mesmo de ATOS MATERIAIS que podem ser praticados por auxiliares do juízo ou por terceiros, a sentença NÃO É SATISFATIVA, dependendo da técnica executiva.

Ademais, a sentença é uma técnica processual que não se confunde com a tutela do direito, tanto é que pode não ser suficiente para prestá-la, dependendo da conjugação de outra técnica processual, TUTELA EXECUTIVA.

Determinadas formas de tutela DECLARATÓRIA e CONSTITUTIVA, são SATISFEITAS apenas com a prolação da sentença.  Afirma-se que as sentenças DECLARATÓRIAS e CONSTITUTIVAS SÃO SATISFATIVAS, e são ASSIM, apenas com a prolação da sentença, mas é preciso observar que tal satisfatividade decorre do fato de prestarem tutelas que não reclamam nada além nada a quem da sentença, dispensando as formas executivas.

E essa diferença já era feita no direito italiano da metade do século XX.
Em suma, após a sentença, o processo só caminha para frente, jamais para os trás.

Outrossim, o processo só irá caminhar para frente quando a tutela do direito NÃO FOI INTEGRALMENTE prestada, dependendo de meios de execução. Nesse caso, a sentença NÃO É BASTANTE ou SUFICIENTE para a prestação da tutela do direito material.

No processo chiovendiano, a única modalidade de sentença dependente da execução era a sentença condenatória, moldada pela doutrina para atender as necessidades de tutela dos direitos daquela época.

A IMPOSSIBILIDADE DE EXECUÇÃO NO CURSO DO PROCEDIMENTO. A REGRA DA NULLA EXECUTIO SINE TITULO

A teoria do processo civil de marca CHIOVENDIANA, isto é, do processo italiano construído no começo do século passado, caracteriza-se pela regra da NULLA EXECUTIO SINE TITULO,  que expressa a impossibilidade de execução sem título.

O título executivo judicial por excelência, A SENTENÇA CONDENATÓRIA, qualificava-se a partir de certos elementos, em especial da existência do direito nele corporificado.

A lógica era simples, supondo-se que, para a invasão coercitiva da esfera jurídica do réu, a JURISDIÇÃO deveria estar amparada na EXISTÊNCIA DE UM DIREITO, o qual dependeria apenas de mecanismos executivos para a sua realização.

Vale dizer que a TUTELA JURISDICIONAL do direito APENAS poderia ser prestada quando o direito fosse reconhecido como EXISTENTE, após a sua adequada discussão no PROCESSO DE CONHECIMENTO.

Por detrás da regra processual escondiam-se, como não poderia deixar de ser, os valores do Estado da época.

A regra da NULLA EXECUTIO SINE TITULO, quando somada a partir da relação do título executivo com a existência do direito, revela a preocupação em NÃO SE PERMITIR que a execução se desse com base em convicção de verossimilhança ou sem que fosse encontrada a chamada CERTEZA JURÍDICA.
PARA EXECUTAR TEM QUE TER CERTEZA, NÃO PODE TER VEROSSIMILHANÇA.

A legitimidade da jurisdição – DA SENTENÇA E DA EXECUÇÃO – era dependente da ideia de que o juiz PODERIA encontrar a VERDADE, quando então o resultado do processo e a sua imposição forçada NÃO poderia ser questionado, e, assim, admitidos como JUSTOS.
Eis a primeira dificuldade em se admitir execução com base em convicção de verossimilhança.


Com a influência do Séc. XIX, fica fácil associar a regra da NULLA EXECUTIO SINE TITULO com a neutralidade do juiz, sabido que essa deveria se comportar como mero aplicador do lei, submetido que era ao princípio da supremacia do legislativo.

Ora, se o juiz DEVE ser neutro, NÃO HÁ COMO deixa-lo aplicar a lei duas vezes, uma ANTES de produzidas as provas e outra ao término do processo.

Vinculada à questão da NEUTRALIDADE, aprecia a garantia da AMPLA DEFESA, compreendida como um direito que DEVERIA ser naturalmente exercido antes da prestação da tutela jurisdicional do direito. Em razão da desconfiança em relação aos juízes e do receio de DECISÕES ARBITRÁRIAS – que pudessem resultar da preferência pela parte autora em detrimento da ré -, PROIBIA-SE a tutela jurisdicional do direito ou qualquer prejuízo à esfera jurídica do réu no curso do processo, isto é, ANTES que ele pudesse ter feito as alegações e produzido as provas necessárias a sua defesa. Ou seja, a exigência de AMPLA DEFESA era uma GARANTIA DE LIBERDADE contra a possibilidade de arbítrio judicial e, por isso, era reafirmada pela regra da NULLA EXECUTIO SINE TITULO.


O princípio do NULLA EXECUTIO SINE TITULO além de ter objetivado demonstrar que a execução NÃO poderia ser realizada sem título, quis também deixar claro que esse deveria conter em si um direito declarado, sem deixar margem para qualquer situação de incerteza. É o que se extrai, por exemplo, da doutrina de Carlo Furno: A IMPOSSIBILIDADE DE RECORRER DIRETAMENTE À VIA EXECUTIVA E A NECESSIDADE CONSEQUENTE DE OBTER UM TÍTULO EXECUTIVO JUDICIAL ATRAVÉS DE UM PROCESSO DE CONHECIMENTO SE EXPLICAM FACILMENTE PELA EXISTÊNCIA DE UMA SITUAÇÃO JURÍDICA SUBSTANCIAL CARACTERIZADA PELO ELEMENTO DE INCERTEZA. Com base neste segundo pressuposto, dada a necessidade de se eliminar a incerteza sobre a situação jurídica substancial, a ação NÃO pode ser exercida senão em via declaratória, a fim de que o ANTECEDENTE lógico-jurídico DA EXECUÇÃO, que é a aptidão da ação para ser exercida IN EXECUTIVIS, encontre sua base na declaração e sua realização na criação do título que condiciona a instauração da via executiva.


Mas a impossibilidade de execução antes do término do processo também pode ser atrelada ao modo como o ESTADO deveria tratar os direitos e as posições sociais.
Se não podem ser consideradas as diferenças entre os direitos e as diversas posições sociais, igualmente não há como pensar em necessidades diferenciadas de tutela do direito material, PARTICULARMENTE na necessidade de antecipação da tutela final, SEMPRE vinculada às diversas situações de direito substancial e às necessidades concretas do autor.

CHIOVENDA faz uma consideração reveladora ao tratar da execução da sentença na pendência do recurso. Eis a sua lição:

ENTREMENTES (ENTRETANTO), PODE OCORRER A FIGURA DUMA SENTENÇA NÃO DEFINITIVA, MAS EXECUTÓRIA, E, POIS, A SEPARAÇÃO ENTRE A DEFINITIVIDADE DA COGNIÇÃO E A EXECUTORIEDADE. É O QUE SUCEDE, EM PRIMEIRO LUGAR, QUANDO A CONDENAÇÃO É CONFIRMADA OU PROFERIDA EM GRAU DE APELAÇÃO, E ISSO PORQUE A SENTENÇA DE APELAÇÃO, SE BEM QUE NÃO DEFINITIVA, POR SUJEITA A CASSAÇÃO, É TODAVIA EXECUTÓRIA, UMA VEZ QUE A CASSAÇÃO NÃO SUSPENDE A EXECUÇÃO DA SENTENÇA, E O MESMO SE DIRÁ DO PEDIDO DE REVOGAÇÃO. CONQUANTO SEJA ESSA UMA FIGURA ANORMAL, porque nos apresenta uma ação executória descoincidente, de fato, da certeza jurídica.



Deixe-se claro que as regras da NULLA EXECUTIO SINE TITULO é marcada pelos valores do ESTADO LIBERAL clássico, pois a precedência da execução sobre a cognição, e mesmo a reunião das atividades de conhecer a executar em um mesmo procedimento, já foram admitidas em vários momentos que lhe antecederam na história.

AS FORMAS DE EXECUÇÃO DA SENTENÇA CONDENATÓRIA NA HISTÓRIA


Se, no direito processual LIBERAL, a execução supunha a verificação da existência do direito e a sua declaração na sentença condenatória – única SENTENÇA NÃO-SATISFATIVA da classificação das sentenças (trinária) daquela época -, é agora importante demonstrar de que modo a sentença CONDENATÓRIA foi executada em alguns momentos da história.

Isto para ficar claro que as formas de execução da sentença condenatória podem variar segundos os valores das épocas.

No direito romano clássico
Na época imperial
No direito dos germânicos
Uma vez proferida a sentença condenatória, era necessário aguardar 30 dias pelo cumprimento da sentença, prazo após o qual o autor, para executar a condenação, deveria propor nova ação, chamada de ACTIO IUDICATI.
Diante dessa nova ação, o réu poderia RECONHECER a condenação e o inadimplemento, ou apresentar DEFESA.
Nesse último caso, o credor pedia que o RÉU fosse condenado a PAGAR o DOBRO  do valor objeto da condenação.
Essa possibilidade, aliada ao poder de o JUIZ reconhecer a má-fé da defesa, fazia com que o condenado se sentisse desestimulado a protelar a execução, não obstante essa dependesse da sua aceitação.

Nessa época, além de a execução ter que se fundar em um direito declarado na sentença condenatória, a sentença condenatória dependia, para ser executada, de NOVA ação.
É a época dos processos EXTRA ORDINEM, a condenação continua a exigir a ação de execução, embora existam diferenças em relação à ação de execução (ACTIO IUDICATI) do processo romano clássico.
Na fase do início da idade média, em que o CREDOR tinha o DIREITO de fazer valer o seu DIREITO através da FORÇA, a lei passou a submeter a penhora a prévia autorização judicial. Porém, o deferimento da PENHORA não se baseava na existência do DIREITO ou na sua PROVA, exigindo apenas um requerimento regular, já que a eventual discussão do direito devia ser objeto da iniciativa do réu, mediante a sua defesa e após a consolidação da penhora.

Então, é possível dizer, que de forma REDUTIVA, que, no curso da história, DUAS FORMAS de EXECUÇÃO se chocaram:
1
2
UMA QUE EXIGIA A AÇÃO DE EXECUÇÃO DA SENTENÇA CONDENATÓRIA, quando era conferida ao condenado a oportunidade de negar a subsistência do direito de crédito declarado na própria condenação (o réu apresenta sua DEFESA).
e OUTRA, contrária, em que se permitia, antes de qualquer discussão o direito, a prática de atos de AFETAÇÃO dos bens do devedor, para que SÓ MAIS TARDE lhe fosse possível controverter o direito.

Aqui, abria-se DUPLA oportunidade para a discussão, uma para permitir a prolatação da condenação – a qual exigia a demonstração do direito de crédito - e a outra para dar ao condenado o direito de IMPUGNAR a SUBSISTÊNCIA do direito declarado na sentença condenatória.
No outro caso, próprio dos povos germânicos, a prática dos atos executivos DISPENSAVA a discussão do direito de crédito e a sentença condenatória, bastando um REQUERIMENTO regular. A discussão do direito, nesse caso, ocorria somente se o devedor, após os atos de execução, negasse o direito de crédito, exigido a sua discussão.


Os juristas da idade média deram BOA SOLUÇÃO ao problema, já que, ao mesmo tempo em que firmaram a necessidade de o credor submeter a sua afirmação de direito à cognição judicial ANTES da prática dos atos de execução, permitiram que os ATOS EXECUTIVOS decorressem imediatamente da sentença condenatória, eliminando a AÇÃO DE EXECUÇÃO DE SENTENÇA. (basta requerimento regular simples - o nome disso é PROCESSO SINCRÉTICO).

Liebman, a ACTIO IUDICATI indicada pelas fontes romanas, significando proposição de novo processo contraditório e, portanto, formalidade demorada e protelatória, foi relegada para casos excepcionais (liquidação de condenação ilíquida, pedido de juros sucessivos à sentença etc...), ao passo que nos casos normais ERA SUFICIENTE simples REQUERIMENTO para que o juiz, SEM A AUDIÊNCIA DO DEVEDOR  e lançando mão das faculdades e deveres inerentes ao seu ofício, praticasse os atos necessários a assegurar a execução da sentença por ele proferida. Determinou-se  esse procedimento de execução PER OFFICIUM JUDICI (Através da função de juiz), considerando-o simples prosseguimento e complemento do ato de prolação da sentença ISTUD OFFICIUM VENIT IN CONSEQUENTIAM CONDEMNATIONIS (As consequências desse escritório veio a condenação) (Bartolo). Isto significou atribuir à sentença condenatória eficácia nova, desconhecida em épocas anteriores, como é a de ser por si só suficiente para permitir a execução, sem necessidade de nova ação e novo contraditório: SENTENTIA HABET PARATAM EXECUTIONEM (Parecer está pronto para execução).

A necessidade de ação de execução para fazer valer a condenação é algo que variou conforme as épocas.

A EQUIPARAÇÃO DA SENTENÇA AO TÍTULO EXECUTIVO EXTRAJUDICIAL. A UNIFICAÇÃO DAS VIAS DE EXECUÇÃO.

Em certo momento da história, por influência das necessidades do comércio, as DÍVIDAS passaram a ser CONFESSADAS perante os tabeliães e os documentos que as corporificaram foram equiparados à sentença condenatória para o efeito de execução. OU SEJA, deu-se ao reconhecimento do DEVEDOR perante o tabelião o mesmo significado da declaração judicial da existência do direito, expressa na condenação.

No direito francês, perdeu-se a necessidade de dar eficácia executiva às chamadas LETTRES OBLIGATOIRES (letras obrigatórias). Para a aquisição de tal eficácia, as LETTRES OBLIGATOIRES tinham que ser reconhecidas pelo devedor, QUE PRECISAVA SER CHAMADO EM JUÍZO, ou então deveriam ser autenticadas pelos NOTÁRIOS. Somente com o aparecimento dessa função de autenticar as obrigações escritas é que os ATOS PARTICULARES de reconhecimento de DÍVIDA passaram a constituir TÍTULO EXECUTIVO, à semelhança da sentença condenatória.


Com o passar dos tempos e a sofisticação das relações comerciais, novos documentos foram QUALIFICADOS como títulos executivos extrajudiciais, sempre com o objetivo de facilitar a execução, tornando-a algo que, ao invés de se basear em uma declaração judicial posterior à verificação do direito, fundava-se apenas em um documento que, visto em ABSTRATO (letra de CÂMBIO, NOTA PROMISSÓRIA, CHEQUE, DEBENTURE, WRRENT, ETC...) era suficiente para fazer CRER QUE EXISTIA UM DIREITO DE CRÉDITO.

É claro que existe uma distinção visível entre a execução fundada em condenação e a execução fundada em documento, uma vez que:
execução fundada em condenação
execução fundada em documento
Há discussão, em procedimento judicial regular (procedimento de conhecimento), sobre a existência do crédito.
Há apenas um documento, ao qual se atribui aptidão para permitir o início da execução.



É exatamente por isso que se outorga ao DEVEDOR, executado a partir de título executivo extrajudicial, a possibilidade de discutir a causa do crédito, ao passo que ao CONDENADO apenas são deferidas defesas que não poderiam ser opostas na fase de conhecimento, quando se verificou a existência do crédito expresso na condenação. (muito importante isso para saber a lógica do procedimento executivo).

Liebman, aliás, ao apontar para o instante em que a “CONVENIÊNCIA DE RÁPIDA realização de algumas categorias de créditos, estipulados com observância de formalidades especiais, fez com que a legislação estatutária das cidades em que o COMÉRCIO FLORESCENTE mal suportava as delongas do processo ordinário, reconhecesse a eficácia da execução aparelhada aos instrumentos de dívida lavrados perante o tabelião”, equiparando o instrumento à sentença, não esquece de demonstrar que aí existia uma importante diferença, NA MEDIDA EM que a execução de sentença estava amparada pela COISA JULGADA sobre a existência do direito, O QUE REDUZIA AS POSSÍVEIS DEFESAS DO EXECUTADO À ARGUIÇÃO DA NULIDADE DA SENTENÇA, OU DO PAGAMENTO POSTERIOR À SENTENÇA, enquanto que, na execução que tinha por base mero instrumento, permanecia ÍNTEGRA a possibilidade de o executado defender-se por todos os meios. (ENRICO TULLIO LIEBMAN).


É interessante salientar que, neste momento da história, conforme adverte LIEBMAN, diferenciaram-se novamente as execuções, pois na execução da sentença, QUE SE APRESENTAVA COMO SIMPLES PROSSEGUIMENTO DA AÇÃO, REDUZIDAS ERAM AS OPORTUNIDADES EM QUE O EXECUTADO PODIA DEFENDER-SE, enquanto que, na execução que vinha baseada em instrumento, ADMITIU-SE, AO CONTRÁRIO, verdadeira ação executiva com prazos especiais para discussão das defesas do executado.

Se a própria história da TEORIA DO DIREITO PROCESSUAL evidencia que, quando se pensou em título executivo extrajudicial, as execuções foram diferenciadas, é de se questionar a razão pela qual, mais tarde, elas foram novamente equiparadas, exigindo-se a propositura de ação em qualquer dos casos.

Não obstante a diferença de extensão de defesa que se deve dar ao executado, conforme a execução esteja fundada em sentença ou em título executivo judicial, NÃO HÁ DÚVIDA QUE A NECESSIDADE DA PROPOSITURA DE AÇÃO deve variar conforme a base em que a execução se funda.

É preciso perceber, nesse caso, que a execução nada mais é do que uma prestação jurisdicional voltada à tutela do direito de crédito. Ora, quando a execução é fundada em título executivo extrajudicial, precedendo à eventual atividade cognitiva que pode ser instaurada pelo devedor, ela obviamente deve iniciar mediante uma ação de execução. Porém, quando a execução é posterior à cognição, fundando-se em sentença, ela apenas constitui a fase final da ação voltada à tutela do direito material.

Em outras palavras, quem vai a juízo, seja a partir de mera afirmação de direito de crédito, seja a partir de título executivo extrajudicial, quer tutela jurisdicional do direito material.
Em um caso de ação, para prestar a tutela do direito, deve passar pela sentença condenatória, complementando-se com a execução. No outro, a ação dispensa a verificação do direito e, assim, a sentença condenatória, viabilizando a imediata instauração da execução. No primeiro caso, a execução é complemento da ação; no segundo, a execução é a única prestação jurisdicional buscada com a ação.

Perceba-se que, quando se exige ação para a execução da sentença, essa está sendo equiparada ao título executivo extrajudicial, quando foi esse último que, por razões decorrentes do desenvolvimento da sociedade comercial, recebeu a eficácia própria da sentença.

A APROXIMAÇÃO entre a execução da sentença e a execução de título extrajudicial, considerando-se um momento mais remoto da história, pode ser encontrada no DIREITO COMUM FRANCÊS. Aí, ao contrário do que aconteceu em outros lugares, as características da atividade executiva, derivada de circunstâncias políticas próprias àquele instante histórico, levaram a execução da sentença a se equiparar à execução de título extrajudicial.

No ABSOLUTISMO, a execução era conduzida pelos FUNCIONÁRIOS DO REI, sucessores dos servidores senhores feudais, mas que, como os que lhe antecederam, não tinham qualquer dependência em relação aos juízes. Os SERGENTS DU ROY, como lembra LEIBMAN, praticavam os atos que as leis deferiam às suas funções sem depender da vontade ou das ordens dos juízes.
A execução das LETRES OBLIGATOIRES (títulos extrajudiciais) e das sentenças era realizada pelos funcionários do rei, independemente de qualquer autorização judicial, bastando para tanto a simples existência de obrigação reconhecida perante o notário OU de sentença.

Como a atividade executiva não dependia do juiz, a execução como visto, era conduzida pelos SERGENTS DU ROY. Nessa circunstância, caso o devedor quisesse se opor à execução, fosse ela fundada em sentença ou em título extrajudicial, teria que apresentar seus argumentos ao juiz sob a forma de ação. Tornou-se necessária, nessa situação, uma AÇÃO do devedor contra o credor, pois o funcionário do rei, embora autorizado à execução, NÃO TINHA PODER PARA RESOLVER SOBRE AS IMPUGNAÇÕES DO DEVEDOR.

Diante desta situação, não há que se falar em autorização judicial para se realizar a execução, mas sim em ação destinada a fazer o juiz impedir a execução. De qualquer forma, o devedor, diante da execução, tinha só a via de ação, variando apenas as matérias alegáveis, mais restritas quando a execução era fundada em sentença, enquanto a execução permanecia uma, estivesse em sua base a sentença ou o título executivo extrajudicial. Ou seja, a execução se destacava da sentença e da obrigação reconhecida perante o notário, adquirindo AUTONOMIA.

Tal ATUONOMIA, além de sinal de que a execução era vista como uma ordenação de atos praticados em conformidade estrita a lei, isto é, como algo mecânico e despido da criatividade atualmente necessária à efetiva tutela dos direitos, evidencia que a função jurisdicional terminava com a prolação da sentença sobre o mérito, ainda que essa não houvesse satisfeito o direito, exatamente porque a tutela do direito desejada pelo autor dependia da prática de atos de execução. Diante disso, a sentença é realmente equiparada ao título executivo extrajudicial, já que ambos guardam distância e autonimia em relação à execução.

De qualquer forma, a verdadeira explicação para a equiparação da execução de sentença à execução de título extrajudicial está no PRINCÍPIO DA AUTONOMIA e da UNIDADE das vias executivas, pouco importando que mais tarde o início da execução tenha passado a depender de AUTORIZAÇÃO JUDICIAL OU DE AÇÃO. Este princípio tem sustentação na ideia de que os INSTRUMENTOS EXECUTIVOS não precisam estar de acordo com as diferentes necessidades de direito material e, assim, podem aspirar à unidade, confortando-se na teoria que desvirtuou o conceito de obrigação e, desta forma, ADMITIU que a sentença sempre condenaria a uma prestação que, em caso de inadimplemento, poderia ser obtida através de via executiva  própria ao direito de crédito.

Perceba-se que, nos casos de EXECUÇÃO DE SENTENÇA e de EXECUÇÃO DE TITULO EXTRAJUDICIAL, passou a existir uma VIA AUTÔNOMA e ÚNICA para a execução. Um PROCEDIMENTO único e completamente neutro em relação ao direito material, para o qual era bastante a existência de título executivo (sentença condenatória ou título executivo extrajudicial).

A FALSA SUPOSIÇÃO DE QUE A SENTENÇA CONDENATÓRIA É TUTELA JURISDICONAL DO DIREITO

A ideia de que a condenação presta tutela jurisdicional ao direito é admitida pela doutrina, seja por aquela que classifica as sentenças apenas com base em CRITÉRIOS PROCESSUAIS, seja por aqueles que tentam classificar as sentenças, inclusive a condenatória, a partir do DIREITO MATERIAL.

Quem admite, a partir de visão EXCLUSIVAMENTE processual, que a condenação é tutela jurisdicional, é obrigado a supor que a condenação basta para satisfazer o que se procura através da ação, sabido que a ação, COMO É INEGÁVEL, deve proporcionar a tutela jurisdicional. Trata-se de uma visão romântica ou distorcida da tutela jurisdicional, pois aposta que o devedor, apenas por ser condenado, satisfará o direito de crédito.

De outra banda, ao se tentar pensar na CONDENAÇÃO a partir do DIREITO MATERIAL, não se consegue qualquer resultado positivo, uma vez que a condenação é INCAPAZ de realizar o direito material ou prestar a tutela do direito. O exemplo de Pontes de Miranda diz isso: O DIREITO PROCESSUAL TEM DE ATENDER À EFICÁCIA DAS AÇÕES SEGUNDO O DIREITO MATERIAL, sendo que, em sua concepção, A AÇÃO DE CONDENAÇÃO SUPÕE QUE AQUELE OU AQUELES, A QUEM ELA SE DIREIGE, TENHAM OBRADO CONTRA O DIREITO, QUE TENHAM CAUSADO DANO E MEREÇAM, POR ISSO, SER CONDENADOS (con-damnare).

Porém, a ação de DIREITO MATERIAL NÃO PODE TER eficácia CONDENATÓRIA, uma vez que ninguém que tenha sofrido dano ou não recebido o pagamento de seu crédito tem direito material à condenação. A condenação é simples técnica processual, dando contornos a uma espécie de ação que nela finaliza, mas não serve à prestação da tutela jurisdicional do direito.

Prova: por que existe a falsa suposição de que a sentença condenatória é tutela jurisdicional do direito? R= é porque a condenação via sentença é simples técnica processual, a ação de direito material não pode ter eficácia condenatória, uma vez que ninguém que tenha sofrido dano ou não recebido o pagamento de seu crédito tem direito material à condenação.

A perspectiva de direito material jamais poderia atrelar a ação à condenação, pois a ela importa a tutela do direito, obtenível através de execução, que deveria simplesmente seguir a condenação. Já a perspectiva eminentemente processual, para se contentar com a condenação, vendo-a como tutela jurisdicional, foi obrigada a teoriza-la como TÍTULO EXECUTIVO, atribuindo-lhe a qualidade de autorizar a propositura da ação de execução.

Ou seja, a doutrina clássica, mediante um exercício de ABSTRAÇÃO, desligou a prestação jurisdicional do direito material, tornando a condenação mera FASE de tutela jurisdicional do direito, porém imprescindível à propositura da ação de execução e, assim, à realização do direito de crédito.

É bom recordar que para LIEBMAN, a sentença condenatória tem conteúdo e função duplos, pois, além de declarar o direito existente, FAZ VIGORAR PARA O CASO CONCRETO AS FORÇAS COATIVAS LATENTES DA ORDEM JURÍDICA, MEDIANTE APLICAÇÃO DA SANÇÃO ADEQUADAS AO CASO EXAMINADO -  e nisto reside a sua função específica, que a diferencia das outras sentenças (função sancionadora). Na concepção de LIEBMAN, a sentença condenatória, ao aplicar a sanção, constitui a situação jurídica que abre oportunidade para a execução. LIEBMAN demonstrou, de fato, que a CONDENAÇÃO opera um fenômeno complexo e vasto, que consiste na constituição de uma nova situação jurídica, autônoma no que concerne à relação substancial obrigacional, fundada na concreta vontade do Estado de que a sanção executiva seja atuada, e que resolve subjetivamente no poder do órgão processual de proceder à atuação da sanção executiva, no poder do credor de provoca-la (ação executiva) e na sujeição do devedor a suportá-la (responsabilidade executiva).

A INFLUÊNCIA DA ECONOMIA LIBERAL: A IMPORTÂNCIA DA TUTELA PELO EQUIVALENTE EM PECÚNIA E A IDONEIDADE DA CONDENAÇÃO

Na época do Estado liberal, o Estado não intervia nas relações privadas, razão pela qual ele não está preocupado em proteger bens ou direitos na forma específica, ou mesmo em conceder a tutela da prestação inadimplida, devendo apenas zelar pela liberdade e repristinar os mecanismos de mercado mediante o sancionamento do faltoso, para o que era suficiente uma tutela jurisdicional de sinal negativo, como a nulidade do contrato ou o pagamento de dinheiro.

Se os bens são equivalentes, e assim não merecem tratamento diversificado, a transformação DO BEM devido em dinheiro está de acordo com a lógica do sistema, cujo objetivo é apenas o de sancionar o faltoso, repristinando os mecanismos de mercado. Por outro lado, se o juiz não pode dar tratamento distinto às necessidades sociais, nada mais natural do que UNIFICAR tal forma de tratamento, dando ao lesado valor em dinheiro. Se todos são iguais – e essa igualdade deve ser preservada no plano do contrato -, não há razão para admitir uma intervenção mais incisiva do juiz diante do inadimplemento, para que então seja assegurada a tutela específica (ou do adimplemento in natura). Se o princípio da igualdade formal atua da mesma forma diante do contrato e do processo, o juiz SOMENTE poderia conferir ao lesado a Tutela pecuniária (Luiz Guilherme Marinoni)

Por outro lado, o art. 1.142 do Código Napoleão – segundo o qual toda obrigação de fazer ou não-fazer resolve-se em PERDAS E DANOS, mais juros no caso de inadimplemento – era apenas um reflexo dos princípios de liberdade e de defesa da personalidade, próprios ao jus naturalismo e ao racionalismo iluminista. Daí a impossibilidade de se constranger O DEVEDOR ao adimplemento na forma específica e a necessidade de a prestação ser CONVERTIDA em pecúnia.

A partir da tutela jurisdicional expressa em pecúnia, perfeitamente adequada à lógica do Estado liberal, construiu-se uma técnica processual que se consubstanciava na condenação, que, em caso de inadimplemento, deveria ser seguida pelos mecanismos executivos de expropriação, destinados a permitir a realização forçada do direito de crédito, mediante a penhora, a venda do bem e o pagamento do credor.

Perceba-se que a NECESSIDADE DE TUTELA – ressarcitória ou da prestação inadimplida – pelo EQUIVALENTE EM DINHEIRO encontra veículo processual idôneo no binômio condenação-execução.

Não obstante, o mesmo NÃO OCORRE em relação aos DIREITOS REAIS e, especialmente, no que toca às novas situações de direito substancial, próprias à sociedade contemporânea.

O DESVIRTUAMENTO DO CONCEITO DE OBRIGAÇÃO E A EXPANSÃO DA CONDENAÇÃO

 NO direito romano existia uma relação entre a ACTIO, OBLIGATIO e a CONDEMNATIO.

A ACTIO contrapunha-se à VINDICATIO, sendo que esta última tutelava os direitos reais. Entendia-se que no direito real havia uma relação entre sujeito e objeto e, assim, que a violação do direito NÃO gerava uma obrigação.
O vencido na ação real NÃO era tratado como o devedor de alguma coisa. Apenas sofria a VINDICATIO do proprietário; não era condenado.

No direito real não há obrigação e, por isso, NÃO há que se falar em ACTIO e em CONDENATIO, mas sim em VINDICATIO e interdito. A ACTIO dizia respeito apenas às pretensões obrigacionais, enquanto o direito real era tutelado pela VINDICATIO. Para o direito real ser tutelado, não há razão para condenar alguém, pois o réu, nesse caso, não tem obrigação e prestação a cumprir, mas sim dever de respeitar a propriedade. É por isso que, tratando-se de violação à propriedade, bastava a VINDICATIO. Nesse último caso a execução era PRIVADA, devendo ser levada a efeito pelo próprio autor, com o auxílio do PRETOR, que concedida um interdito, mediante o qual se exigia que o réu não se opusesse à retomada privada do bem.

Porém , o DIREITO MODERNO transformou a VINDICATIO em ACTIO, isto é, fez com que a ACTIO passasse a ser a ação cabível para a tutela dos direitos reais. Isto decorreu do desvirtuamento do conceito de obrigação, que, de sua raiz entrelaçada ORIGINARIAMENTE apenas com o contrato e com o dono, estendeu-se a todas as relações jurídicas.

Examinando-se o nexo entre obrigação e ação de condenação, primeiro no direito moderno, e depois no direito romano clássico, encontra-se uma profunda distinção. Aqui, assim no direito das obrigações como no direito real, a garantia que a lei cria ao interesse em relação a um determinado bem, faz surgir, eventualmente, ao titular, a expectativa, e em outra pessoa a obrigação de realizar voluntariamente esta expectativa. A diferença essencial é que a pessoa, de frente a qual a expectativa surge, que em um lugar é determinada desde o início, em outro se determina pela primeira vez com violação do direito; mas em ambas as categorias de direitos, igualmente estão presentes os elementos da expectativa e da obrigação.

De qualquer forma, a aproximação entre as ações IN PERSONAM e as ações IN REM contribuiu para a formação do que se passou a chamar de PERSONALIZAÇÃO do direito real, fenômeno que teve consagração em uma conclusão de KANT, segundo a qual todo direito – real ou pessoal – resume-se em uma relação INTERPESSOAL, vale dizer, OBRIGACIONAL ENTRE PESSOAS E NÃO NUMA RELAÇÃO ENTRE PESSOA E COISA.

KANT não admite que as coisas possam ser objeto de direitos e deveres e sustenta que a relação jurídica, na qual estão em relação direitos e deveres, configura-se sempre entre pessoas, oferecendo assim a primeira configuração da TEORIA PERSONALISTA do direito real, na qual o CARÁTER ABSOLUTO da relação torna-se a nota qualificante da categoria.

Segundo a chamada teoria PERSONALISTA do direito real, predominante na SEGUNDA METADE do séc. XIX e na primeira metade do séc. XX, a relação entre SUJEITO e COISA não teria relevância jurídica, pois o direito seria constituído por regras atinentes às relações INTERSUBJETIVAS; a relação jurídica dar-se-ia EXCLUSIVAMENTE entre sujeito e sujeito, e NÃO ENTRE sujeito e coisa.

O DIREITO REAL, nesta perspectiva, é configurado como poder ou pretensão de um sujeito no confronto de todos os outros sujeitos do ordenamento, os quais são levados a SE ABSTER de qualquer ingerência sobre a coisa. Dessa forma, o conteúdo do poder que constitui o direito real torna-se NEGATIVO, da mesma forma que é NEGATIVO o dever geral, que recai sobre todos  os SUJEITOS DO ORDENAMENTO, de não turbar o titular do direito no exercício do próprio direito.

O alargamento do conceito de obrigação, também devido à teoria personalista do DIREITO REAL, conduzi à universalização da sentença condenatória. A EXPANSÃO DO CONCEITO DE OBRIGAÇÃO gerou o entendimento de que, qualquer que fosse a relação substancial litigiosa, a execução deveria supor o inadimplemento da condenação, como se o réu sempre estivesse obrigado a cumprir uma prestação.

A IMPROPRIEDADE DA SENTENÇA CONDENATÓRIA PARA A TUTELA DOS DIREITOS ABSOLUTOS

Os direitos absolutos são caracterizados por uma relação jurídica imaginária, existente entre o titular do direito e todas as demais pessoas, que teriam, em relação ao titular do direito, um dever de abstenção. Entretanto, o dever negativo de abstenção, que caracteriza os chamados DIREITOS ABSOLUTOS, nada mais é do que o DEVER DE RESPEITO ou de ALTERUM NON LAEDERE, ou seja, o dever de não invadir a esfera jurídica alheia, dever que deve proteger todas as esferas jurídicas, todos os DIREITOS SUBJETIVOS, e, desta forma, também os direitos relativos.

A configuração do dever negativo de abstenção, típico do direito absoluto, como um mero dever de ALTERUM NON LAEDERE, já deixa entrever a superação do conceito KANTIANO de direito real e, mais do que isso, o papel que se atribuiu à figural da RELAÇÃO JURÍDICA na dogmática do direito civil.

O direito do ESTADO contemporâneo NÃO É MAIS um mero sistema de limites às esferas jurídicas individuais, estando submetidos a um universo de valores completamente diverso daquele que iluminou as concepções do final do século XIX; o direito é visto hoje como um instrumento que, marcado principalmente pelos valores da igualdade e da solidariedade, visa a permitir o desenvolvimento da personalidade humana e a realização das relações sociais através da tutela – NÃO MAIS FORMAL, mas CONCRETA – da dignidade e do desenvolvimento do homem na comunidade em que vive.

Essa alteração dos FINS do Estado e do direito permite que a norma seja considerada NÃO MAIS como fonte de deveres e proibições e, consequentemente, da relação DIREITO/OBRIGAÇÃO, mas como instrumento de valoração da atividade humana por parte do ordenamento. Isso significa, precisamente, que o direito subjetivo, por consequência, não precisa mais ser construído sobre a base da noção de relação jurídica.

Se é verdadeira a proporção segundo a qual as relações jurídicas se constituem entre homens, NÃO O É AQUELA SEGUNDO A QUAL O DIREITO ASSEGURA UM BEM DA VIDA ÀS PESSOAS NECESSARIAMENTE ATRAVÉS DE UMA RELAÇÃO JURÍDICA.

O problema da relevância jurídica se coloca atualmente como qualificação do fato diretamente pela norma, ou seja, como SUBSUNÇÃO DO FATO em um paradigma normativo INDEPENDENTEMENTE  do seus efeitos, e prescinde, obviamente, da necessidade de construção da relevância jurídica sob o aspecto externo da relação. Assim, a relação sujeito-coisa é juridicamente RELEVANTE para a identificação do tipo normativo do direito real: mas tal relação não se configura como relação jurídica nem entre sujeito e coisa, nem entre o sujeito e as demais pessoas. (autor Comporti).



Na relação jurídica há uma correlação entre a SITUAÇÃO ATIVA, dita também de vantagem, e a SITUAÇÃO PASSIVA, que seria de desvantagem. No DIREITO REAL, porém, não há essa correlação, exatamente porque o conteúdo do DIREITO REAL tem a ver com a relação de utilidade com a coisa, não dependendo do adimplemento daqueles que possuem o dever negativo de abstenção; não é possível fazer ver o conteúdo do direito real afirmando sua relação com um DEVER NEGATIVO DE ABSTENÇÃO.

Então, COMPORTI demonstra que TODOS OS DIREITOS são RELATIVOS  em relação ao objeto e ABSOLUTOS no que concerne a sua INVIOLABILIDADE por parte dos sujeitos do ordenamento afirmando a oportunidade da distinção entre OPONIBILIDADE – com sua consequente característica de inviolabilidade por parte dos terceiros – e exigibilidade do direito, ou seja, o PODER de um sujeito obter uma determinada prestação da parte de um outro sujeito no âmbito de uma específica relação jurídica. Assim, todos os direitos subjetivos devem ser qualificados de ABSOLUTOS, porque existem e são tutelados em face de terceiros. Já na perspectiva de sua realização, ou exigibilidade, alguns realizam o seu conteúdo independentemente da colaboração alheia, e dessa forma, com novo significado, podem ser denominados absolutos, ENQUANTO OUTROS REALIZAM SEU CONTEÚDO NA RELAÇÃO COM OUTROS SUJEITOS, CUJO COMPORTAMENTO É INSTRUMENTAL A SUA REALIZAÇÃO, E ENTÃO PODEM SER QUALIFICADOS DE RELATIVOS.

Todo o direito É INVIOLÁVEL; o CONTEÚDO particular de cada direito é que pode dispensar, ou não, uma colaboração alheia. Os direitos da personalidade, por exemplo, realizam o seu conteúdo INDEPENDEMENTE da colaboração alheia. O titular do direito à imagem NÃO PRECISA que alguém pratique ou deixe de praticar um ato PARA TER O SEU DIREITO REALIZADO; quando alguém ameaça agredir o seu direito, surge ao titular do direito à imagem a POSSIBILIDADE de EXIGIR que o eventual agressor se ABSTENHA de praticar o ato, não porque haja uma relação jurídica entre o titular do direito e o eventual agressor, e, portanto, uma obrigação, mas sim porque o ordenamento garante a INVIOLABILIDADE do direito à imagem, conferindo ao seu titular uma espécie de tutela (A INIBITÓRIA) que assegura o conteúdo do seu direito.

AS NOVAS SITUAÇÕES DE DIREITO SUBSTANCIAL CARENTES DE TUTELA E A INADEQUAÇÃO DA CONDENAÇÃO

No direito romano, uma vez proferida a sentença reconhecendo o direito de propriedade, o autor poderia recuperar o objeto de seu domínio INDEPENDENTEMENTE de qualquer colaboração do réu. Ou seja, declarada a ILEGITIMIDADE da posse do demandado, a ação de recuperação da coisa PRESCINDIDA totalmente a vontade do demandado, que justamente por isso não era condenado.
Algo distinto ocorria no caso de obrigação e condenação, já que, nessa hipótese, por ser NATURALMENTE NECESSÁRIA UMA PRESTAÇÃO DO DEVEDOR, podia o autor apenas manter o devedor em cativeiro à espera de um terceiro que, pagando a dívida, o libertasse.

Nessa perspectiva, é bastante clara a razão pela qual em uma hipótese podem ser praticados ATOS EXECUTIVOS imediatamente e, em outra, há de se esperar o inadimplemento para o início da execução. Contudo, a falta de adequação entre DIREITOS REAIS e CONDENAÇÃO se estende naturalmente a outras situações de direito substancial, próprias da sociedade contemporânea, especialmente quando se percebe a distinção entre ATO CONTRÁRIO ao direito, inadimplemento e dano.

É preciso perceber que a norma jurídica, no ESTADO contemporâneo, é um instrumento que protege direitos, impondo ou proibindo condutas, ou mesmo os assegura, permitindo o seu exercício, independemente de qualquer relação jurídica. O direito é uma posição juridicamente tutelada. Porém, para se ter uma posição juridicamente protegida, não é necessária a existência de uma relação jurídica. Se uma posição é juridicamente protegida quando o conteúdo do direito é tutelado, não é possível ignorar que a tutela de um direito pode depender ou não da colaboração alheia. Ora, como antes demonstrado, alguns direito realizam o seu conteúdo independentemente da colaboração alheia, ao passo que outros realizam seu conteúdo na relação com outros sujeitos, cujo comportamento é instrumental a sua realização.

Se uma norma, para proteger ou assegurar um direito, impõe uma conduta ou uma abstenção, a prática de ato contrário ao direito (a violação da norma), assim como a ameaça da sua prática, abrem oportunidade para a tutela jurisdicional, independentemente de relação jurídica ou de prestação devida. Nesse caso, não há que se falar em prestação inadimplida ou em dano, mas apenas em ato contrário ao direito.

Assim, por exemplo, se alguém expõe à venda produto nocivo à saúde do consumidor, o legitimado à tutela dos direitos dos consumidores pedirá a tutela de remoção dos efeitos concretos derivados do ilícito, requerendo, como técnica processual executiva, a busca e apreensão dos produtos. Nesse caso, como é pouco mais do que evidente, não há razão para se pedir a condenação do infrator a uma prestação. Isto porque o réu não é devedor de prestação alguma. A realização do conteúdo do direito, assim como a tutela jurisidiconal do direito, independe de qualquer colaboração do réu. E, numa hipótese como essa, basta ao juiz DECLARAR o ilícito e mandar expedir MANDADO DE BUSCA E APREENSÃO dos produtos, o que significa simplesmente declarar o ILÍCITO e AUTORIZAR a retirada dos produtos do mercado.

A declaração judicial da prática de ato contrário ao direito NÃO fica à espera de qualquer prestação do demandado, ao contrário do que acontece quando há inadimplemento de obrigação contratual ou dano. Quem viola uma obrigação ou comete um dano ESTÁ OBRIGADO a uma prestação ou ao ressarcimento do dano, NÃO OCORRENDO O MESMO QUANDO SE PRATICA UM ATO CONTRÁRIO AO DIREITO. Nesse último caso, não há que se esperar algo ou alguma prestação de quem praticou o ilícito, RESTANTO À JURISDIÇÃO APENAS REMOVER OS SEUS EFEITOS CONCRETOS.

Quem viola uma obrigação ou comete um dano
SE PRATICAR UM ATO CONTRÁRIO AO DIREITO
Á OBRIGADO a uma prestação ou ao ressarcimento do dano
O juiz vai REMOVER seus efeitos concretos.

No caso em que a sentença declara a probabilidade da violação ou a violação do direito, o direito obviamente NÃO depende de qualquer prestação, sendo absolutamente desnecessário esperar algo do demandado para implementar a tutela jurisdicional. Em tais situações, o juiz não atual no lugar do demandado, nem para suprir algo que é por ele devido.

Quando se inibe o ilícito ou se remove os seus efeitos, a ameaça ao direito ou a prática do ilícito NÃO requerem qualquer prestação do réu, sendo necessários atos de COERÇÃO apenas para que a declaração contida na sentença se transforme em realidade, ao passo que, nos casos de ressarcimento ou de adimplemento, há declaração de algo que ainda precisa ser feito, aparecendo a execução como indispensável para realizar o que deveria ter sido prestado pelo demandado.

Os direitos que realizam o seu conteúdo INDEPENDENTEMENTE da colaboração alheia, ou que SÃO TUTELADOS sem que seja NECESSÁRIA uma prestação devida pelo DEVEDOR da relação jurídica, exigem uma forma de execução que não se destina a fazer valer uma prestação inadimplida, e assim não devem ser tutelados através da condenação. 

VIGÊNCIA E EFICÁCIA DAS NORMAS NO TEMPO


VIGÊNCIA E EFICÁCIA DAS NORMAS NO TEMPO

Vamos estudar a norma e o momento em que ela é aplicada.
Para tanto, deve-se fazer a distinção entre NORMAS DE CUSTEIO e NORMAS DE PRESTAÇÃO PREVIDENCIÁRIA.

NORMAS DE CUSTEIO
NORMAS DE PRESTAÇÃO PREVIDENCIÁRIA
Uma vez em vigor, a norma de custeio do sistema, quando disponha sobre CRIAÇÃO ou MODIFICAÇÃO de CONTRIBUIÇÕES SOCIAIS, só poderá ser exigida após decorridos 90 dias de sua PUBLICAÇÃO. 

É a regra do art. 195, §6º da CF.(nonagesimal).

As demais normas de custeio, bem como, as normas de prestação previdenciária são EFICÁZES a partir da data em que a própria norma previr sua entrada em VIGOR, e, na ausência de tal fixação, no prazo estabelecido pela LICC para VACATIO LEGIS, ou seja, 45 dias após sua publicação.
Naturalmente, obedecida a regra principiológica da irretroatividade da lei, tem-se que a LEI não surte efeitos pretéritos. Ela é feita para regular fatos futuros, ou seja, a partir da sua entrada em vigor.


No direito previdenciário, nem mesmo para beneficiar eventuais infratores da norma de custeio.

Observe-se, não se está tratando da norma de direito penal (ante a possível existência de crime de sonegação fiscal ou apropriação indébita), mas daquela que tem NATUREZA TRIBUTÁRIA, e que fixa a obrigação tributária e a mora do devedor.

A lei nova, obedecendo à garantia constitucional, NÃO PREJUDICA o direito adquirido, o ato jurídico perfeito ou a coisa julgada.

Assim, por exemplo, o segurado que já possuía direito à aposentadoria ANTES da vigência da lei 9876/99 tem direito de, a qualquer tempo, REQUERER o benefício com base nas regras antigas de cálculo – ou seja,  sem a aplicação do FATOR PREVIDENCIÁRIO.

Neste caso, mesmo estando a lei REVOGADA, ao tempo em que era vigente houve o preenchimento de TODOS OS REQUISITOS NELA PREVISTOS.

Portanto, havendo adquirido o direito à época em que vigorava a  lei, é ele exercitável a qualquer tempo, mesmo após a REVOGAÇÃO da norma jurídica em que se baseia.

Não caracteriza direito adquirido O FATO de um INDIVÍDUO já estar filiado a um REGIME de PREVIDENCIA SOCIAL, para efeito de pretensão de ULTRA-ATIVIDADE de normas que vierem a ser revogadas antes que o mesmo tenha implementado TODOS os requisitos legais para o exercício do direito.  

Em suma, como costuma frisar a jurisprudência dominante: NÃO HÁ DIREITO ADQUIRIDO A REIME JURÍDICO. Se ao tempo da modificação da norma o indivíduo NÃO TINHA AINDA POSSIBILIDADE de postular a prestação previdenciária, a mudança legislativa pode alterar sua expectativa.

A possibilidade de edição de REGRAS DE TRANSIÇÃO, embora defendida ardorosamente pela doutrina portuguesa como direito daqueles que se encontram em vias de adquirir o direito, NÃO ENCONTRA BASE JURÍDICA TAL QUE SEJA ASSEGURADA AOS DETENTORES DA EXPECTATIVA DE DIREITO.

O FATO de serem utilizados como BASE DE CÁLCULO do benefício  salários de contribuição que antes NÃO ERAM considerados, NÃO CARACTERIZA RETROAÇÃO DA EFICÁCIA DA LEI – hipótese de aplicação da lei 9876/99 no que tange ao cálculo do VALOR-BASE da aposentadoria.

Então, as normas constitucionais que dependem de regulamentação NÃO SÃO exigíveis antes da lei – COMPLEMENTAR ou ordinária – que discipline a matéria.

É o caso, por exemplo, da previdência complementar dos servidores públicos prevista no art. 40, §15 da CF, sendo que a LC 109, de 29/5/2001, estabeleceu normas gerais, porém NÃO instituiu o regime previdenciário complementar dos entes da ADM. PÚB. FEDERAL direta, autárquica e fundações públicas, o que deverá ser objeto de lei específica.

VIGÊNCIA E EFICÁCIA DAS NORMAS NO ESPAÇO

Em relação à aplicação das normas de Direito Previdenciário, tem-se que, COMO REGRA, se adote o princípio da TERRITORIALIDADE.
Não há cabimento para utilizar-se GENERICAMENTE da hipótese de EXTRATERRITORIALIDADE da lei.

Em sendo assim, SÃO taxativas as situações em que se adotará a LEI brasileira EM RELAÇÕES JURÍDICAS fora de nosso território.

Uma importante EXCEÇÃO aparece com a lei 6887/80, que prevê a adoção da legislação previdenciária brasileira também aos entes diplomáticos existentes no Brasil.

Obs: Martinez : quem presta serviços para embaixadas e consulados ou a órgãos a ela subordinados ESTÁ SUJEITO À REGULAMENTAÇÃO PRÓPRIA. São SEGURADOS OBRIGATÓRIOS na condição de EMPREGADOS, mas o não-brasileiro SEM residência permanente no Brasil ou o brasileiro, protegido pela legislação do País representado, está excluído do RGPS.

Fugindo à regra de que a lei que rege a relação jurídica É A DO LUGAR DA EXECUÇÃO DO CONTRATO – lex loci executionis -, a legislação pátria admite como segurado obrigatório o BRASILEIRO OU ESTRANGEIRO, residente e domiciliado no Brasil e contratado para trabalhar no exterior para empresa brasileira, INDEPENDEMENTE de estar amparado por outro regime previdenciário, no local da execução do contrato.

O mesmo ocorre com o brasileiro civil que trabalha para a UNIÃO no EXTERIOR, em ORGANISMOS oficiais BRASILEIROS ou internacionais em que o Brasil seja MEMBRO EFETIVO, mesmo sendo domiciliado e contratado no estrangeiro, nesse caso, EXCEPCIONA a hipótese de possuir amparo por regime previdenciário do país em que labora.