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quinta-feira, 3 de julho de 2014

Questões de prova de concurso público - Discursiva 2

1) Disserte Uso e usufruto. 

Nas palavras de Orlando Gomes, “o usufruto de direitos consiste na atribuição a outrem das utilidades de um direito, durante um certo período de tempo, resguardada a sua existência e integridade” (Gomes, Orlando. “Usufruto de direitos”. In: Revista Forense, v. 180, p. 36-41).
Na lição de Caio Mário da Silva Pereira, “usufruto é o direito real de fruir as utilidades e frutos de uma coisa sem alterar-lhe a substância, enquanto temporariamente destacado da propriedade” (Instituições de direito civil - direitos reais, 18. ed. Rio de Janeiro, Forense, v. IV, 2003).

O atual Código Civil não reproduziu o art. 726 do Código Civil de 1916, que disciplinava o quase-usufruto, ou usufruto impróprio, incidente sobre as coisas consumíveis - às quais, para esse efeito, se equipararam às fungíveis - e que caíam no domínio do usufrutuário, que se obrigava a restituí-las no equivalente em gênero, qualidade e quantidade, regendo-se, no geral, pelas regras do mútuo.

As coisas consumíveis e fungíveis não mais podem ser dadas em usufruto, como objeto principal, havendo o Código Civil de 2002 resgatado a pureza da garantia real, exigindo a preservação da substância - ressalva-se apenas a exceção do art. 1.392, § 1º, que trata dos acessórios e acrescidos consumíveis.

Quanto às florestas e recursos minerais passíveis de exploração, vigora a convenção entre as partes. No silêncio do título, somente se admite a extração, pelo usufrutuário, se as árvores já se destinavam pelo proprietário para o corte, ou se já havia atividade de exploração mineral no terreno (Viana, Marco Aurélio S. Comentários o novo Código Civil. Rio de Janeiro, Forense, 2003, v. XV I, p. 628).

Via de regra, portanto, o usufrutuário faz jus aos frutos (naturais ou civis) e às utilidades, mas, não, aos produtos.

Características do usufruto: a) é direito real sobre coisa alheia móvel, imóvel, bens incorpóreos e até sobre uma universalidade, gravando temporariamente o (os) bem(s) em favor de uma pessoa (por isso alguns autores, indevidamente, denominam-no servidão pessoal), com efeito erga omnes, distinguindo- se, portanto, da locação; b) é temporário, podendo ser a termo, ou sob condição resolutiva, quando muito vitalício, extinguindo-se com a morte do usufrutuário, pela sua natureza personalíssima; c) provoca o desdobramento da posse, atribuindo a posse direta ao usufrutuário e reservando a posse indireta ao nu-proprietário; d) é intransmissível, podendo apenas ser cedido o seu exercício (art. 1.393, do Código Civil); e) quando decorrer de ato inter vivos, constitui-se por ato solene quando envolver imóveis;

O Código Civil de 2002 não prevê a possibilidade de constituição de usufruto vidual dos cônjuges (art. 1.611, CC/1916) e companheiros supérstites (art. 2º, Ie II, da Lei n. 8.971/94), sobre parte dos bens do falecido, porque atualmente concorrem eles em propriedade plena com os herdeiros de primeira e segunda classe. Os usufrutos viduais constituídos antes da vigência do Código Civil de 2002 continuam a produzir os seus efeitos, até que sejam extintos.

o uso é direito real mais restrito, limitado às necessidades próprias e da família do usuário.

No dizer de Caio Mário da Silva Pereira, a principal distinção entre os direitos reais do usufruto e de uso está em que “enquanto o usufrutuário aufere toda a fruição da coisa, ao usuário não é concedida senão a utilização reduzida aos limites de suas necessidades” (Instituições de direito civil, 18. ed. Rio de Janeiro, Forense, 1995, v. IV, p. 307).

É certo que a cabeça do artigo 1.412, do Código Civil, refere que o usuário não somente usará a coisa, como também receberá os frutos, quando o exigirem as necessidades suas e de sua família. Pode receber frutos naturais e civis, mas na medida de suas necessidades. Pontes de Miranda diz que os frutos destinados ao consumo por necessidade integram o conceito de uso, e não de fruição (Tratado de direito privado. Rio de Janeiro, Borsoi, 1973, v. X IX , p. 323).

Podemos lembrar, ainda, do Enunciado 252 da III Jornada de Direito Civil:

“A extinção do usufruto pelo não-uso, de que trata o art. 1.410, inc. VIII, independe do prazo previsto no art. 1.389, inc. III, operando-se imediatamente. Tem-se por desatendida, nesse caso, a função social do instituto”.

Outro ponto de importante efeito diz respeito à função social do usufruto, como destaca o art. 1.410 do Código Civil e a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça:

DIREITO CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE EXTINÇÃO DE USUFRUTO. PREQUESTIONAMENTO. AUSÊNCIA. SÚMULA 211/STJ. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL NÃO DEMONSTRADO. REEXAME DE FATOS E PROVAS. INADMISSIBILIDADE. NÃO USO OU NÃO FRUIÇÃO DO BEM GRAVADO COM USUFRUTO. PRAZO EXTINTIVO. INEXISTÊNCIA. INTERPRETAÇÃO POR ANALOGIA. IMPOSSIBILIDADE. EXIGÊNCIA DE CUMPRIMENTO DA FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE.
1-3. (...)
4- O usufruto encerra relação jurídica em que o usufrutuário - titular exclusivo dos poderes de uso e fruição - está obrigado a exercer seu direito em consonância com a finalidade social a que se destina a propriedade. Inteligência dos arts. 1.228, § 1º, do CC e 5º, XXIII, da Constituição.
5- No intuito de assegurar o cumprimento da função social da propriedade gravada, o Código Civil, sem prever prazo determinado, autoriza a extinção do usufruto pelo não uso ou pela não fruição do bem sobre o qual ele recai.
6- A aplicação de prazos de natureza prescricional não é cabível quando a demanda não tem por objetivo compelir a parte adversa ao cumprimento de uma prestação.
7- Tratando-se de usufruto, tampouco é admissível a incidência, por analogia, do prazo extintivo das servidões, pois a circunstância que é comum a ambos os institutos - extinção pelo não uso - não decorre, em cada hipótese, dos mesmos fundamentos.
8- A extinção do usufruto pelo não uso pode ser levada a efeito sempre que, diante das circunstâncias da hipótese concreta, se constatar o não atendimento da finalidade social do bem gravado.
9- No particular, as premissas fáticas assentadas pelo acórdão recorrido revelam, de forma cristalina, que a finalidade social do imóvel gravado pelo usufruto não estava sendo atendida pela usufrutuária, que tinha o dever de adotar uma postura ativa de exercício de seu direito.
10- Recurso especial não provido.
(REsp 1179259/MG, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 14/05/2013, DJe 24/05/2013)

2)  A anterior inscrição de nome empresarial confere ao seu titular o direito de impedir, no território da unidade federada correspondente à Junta Comercial que realizou tal inscrição, o registro de marca com idêntica designação? 

R= A anterior inscrição de nome empresarial no órgão competente merece proteção no ordenamento jurídico. Com efeito, o artigo 34 da Lei n. 8934/1994 estabelece que o nome empresarial obedecerá aos princípios da veracidade e da novidade. O primeiro significa que o nome empresarial não poderá conter nenhuma informação falsa. Sendo a expressão que identifica o empresário em suas relações, é necessário que o nome empresarial só forneça dados verdadeiros àquele que negocia com o empresário. Dessa forma, pode ser que, em alguns casos, seja obrigatória a alteração do nome empresarial. Logo se ocorrer a morte de sócio ou saída de algum sócio cujo nome consta da firma ou denominação social, imperioso será a alteração do nome empresarial em atenção ao postulado da veracidade. O segundo consiste na proibição de registrar um nome empresarial igual ou muito parecido com outro já registrado (CC artigo 1.163). Cabe à junta comercial onde o empresário ou sociedade empresária requereu o arquivamento de seus atos constitutivos proceder à análise da eventual colidência entre o nome empresarial levado a registro e outro nome empresarial já registrado. Ressalte-se que a proteção ao nome empresarial, quanto ao princípio da novidade, se inicia automaticamente a partir do registro e é restrita ao território do Estado da junta comercial em que o empresário se registrou, nos termos do artigo 1.166 do CC/02. Por outro lado, a marca é um dos bens da propriedade industrial protegido mediante o “registro” no INPI, autarquia federal cuja atribuição é tutelar a propriedade industrial no país. O artigo 122 da Lei n. 9279/1996 define a marca como sendo sinais distintivos visualmente perceptíveis, não compreendidos nas proibições legais. Para a doutrina, a finalidade da marca é diferenciar o produto ou serviço dos seus concorrentes no mercado. Em outras palavras, a marca tem a finalidade de identificar determinado produto ou serviço do empresário, distinguindo-o dos demais, ela deve cumprir de forma eficiente essa função, sob pena de não ser considerada como marca e, via de consequência, não poder ser registrada. É por essa razão que não se admite como marca expressões genérica, que não sirvam para distinguir um produto ou serviço de outros. Nesse horizonte, a própria lei n. 9279/96 prevê algumas proibições quanto ao registro de marca, dentre elas, está a vedação de registrar elemento caracterizador ou diferenciador de título de estabelecimento ou nome empresarial de terceiros, suscetível de causar confusão ou associação com estes sinais distintivos (art. 124, V). Nesse passo, sobre a vedação do inciso V do art. 124 da Lei em questão. A questão trata do conflito do nome empresarial com a marca. Nesse caso, o STJ entende o nome empresarial goza de proteção dentro do Estado da junta comercial em que foi registrado e, esta proteção pode ser estentida a todo o território nacional, mediante arquivamento de pedido de proteção de nomes empresariais nas juntas comerciais dos demais Estados, devendo ser compreendida de modo relativo, o que significa que, o registro mais antigo não tem o condão de impedir “a utilização do nome em segmento diverso, sobretudo quando não se verifica qualquer confusão, prejuízo ou vantagem indevida no seu emprego”. Por sua vez, o titular de uma marca possui a prerrogativa de utilizá-la, com exclusividade, no âmbito desta especialidade, em todo o território nacional pelo prazo de duração do registro no INPI. Muito embora, as formas de proteção ao uso das marcas e ao nome empresarial sejam distintas, a dupla finalidade que está por de trás dessa tutela é a mesma, qual seja, por um lado proteger a marca ou o nome da empresa contra usurpação, proveito econômico parasitário e o desvio desleal de clientela alheia e, por outro, evitar que esse último aspecto, o que se vê é que tanto a marca quanto o nome empresarial confere uma imagem aos produtos e serviços prestados pelo empresário, agregando, como o tempo, elementos para a aferição da origem do produto e do serviço.  A função da marca é permitir ao público, em uma estrutura econômica de concorrência, distinguir os produtos ou serviços, de outros que com eles dividem o mercado e buscam a conquista do consumidor. Assim, a propriedade das marcas registradas no INPI tem proteção garantida no art. 5º, XXIX, da CF. Ademais, este mesmo dispositivo constitucional alude à proteção ao nome empresarial, cuja regulamentação está contida no artigo 124, V da LPI que prevê a proibição de registro de “reprodução ou imitação de elemento característico ou diferenciador de título de estabelecimento ou nome de empresa de terceiros, suscetível de causar confusão ou associação com estes sinais distintivos.” Com isso, diante do conflito entre nome empresarial e marca o tratamento é o mesmo conferido à verificação de colidência entre marcas, em atenção ao princípio constitucional da liberdade concorrência, que impõe a lealdade nas relações de concorrência. Dessa forma, diante de eventual colidência entre denominação e marca aplica-se os princípios da anterioridade, territorialidade, ligado ao âmbito geográfico de proteção e princípio da especificidade, segundo o qual a proteção da marca, salvo quando declarada pelo INPI de “alto renome” (ou notória), segundo o art. 67 da Lei 5772/71 está diretamente vinculada ao tipo de produto ou serviço, como decorrência da necessidade de se evitar erro, dúvida ou confusão entre os usuários. Destarte, para que a reprodução ou imitação de elemento característico ou diferenciado de nome empresarial de terceiros constitua óbice ao registro de marca, que possui proteção nacional, é necessário, que primeiro : que a proteção ao nome empresarial não goze somente de tutela restrita a alguns estados, mas detenha a exclusividade sobre o uso do nome em todo o território nacional; segundo, que a reprodução ou imitação seja suscetível de causar confusão ou associação com estes sinais distintivos. Dessa forma, o STJ já decidiu que  frente ao risco de ocorrência de associação de ideias ou confusão no mercado, o art. 124, V da LPI exige que a proteção do nome empresarial a ser tutelado tenha proteção nacional. Assim, no caso da questão se o nome empresarial somente foi registrado na junta comercial do Estado sede territorial da sociedade empresária, não tendo proteção em todo o território nacional isso não lhe confere o direito de impedir o registro de marca com idêntica designação.
COMENTÁRIO FINAL: A anterioridade da inscrição do nome empresarial, de per si considerada, não é inibitória do registro de marca que reproduz ou imite elemento integrante daquele. A inibição somente se perfaz quando o nome empresarial tem proteção estendida a todo o território nacional (territorialidade ampliada) e, para além disso, for reconhecido que a reprodução ou imitação é passível de gerar confusão no discernimento dos consumidores em virtude de as empresas envolvidas operarem no mesmo ramo de atividade (especificidade). 

3)Contribuinte efetua pagamento de tributo em 2006. Em 2009, faz pedido administrativo de restituição, que é indeferido em definitivo em 2012. Em 2013, diante da negativa administrativa,  o contribuinte efetua pedido judicial de restituição do tributo. A Fazenda Pública, ao contestar o feito, alega prescrição, já que entre o suposto pagamento indevido(2006) e o pedido  judicial(2013) passaram-se mais de cinco anos. Analise a alegação da Fazenda Pública.

Prevê o Código Tributário Nacional:

Art. 165. O sujeito passivo tem direito, independentemente de prévio protesto, à restituição total ou parcial do tributo, seja qual for a modalidade do seu pagamento, ressalvado o disposto no § 4º do artigo 162, nos seguintes casos:
I - cobrança ou pagamento espontâneo de tributo indevido ou maior que o devido em face da legislação tributária aplicável, ou da natureza ou circunstâncias materiais do fato gerador efetivamente ocorrido;
II - erro na edificação do sujeito passivo, na determinação da alíquota aplicável, no cálculo do montante do débito ou na elaboração ou conferência de qualquer documento relativo ao pagamento;
III - reforma, anulação, revogação ou rescisão de decisão condenatória.


Art. 168 - O direito de pleitear a restituição extingue-se com o decurso do prazo de 5 (cinco) anos, contados:
I - nas hipóteses dos incisos I e II do artigo 165, da data da extinção do crédito tributário;
II - na hipótese do inciso III do artigo 165, da data em que se tornar definitiva a decisão administrativa ou passar em julgado a decisão judicial que tenha reformado, anulado, revogado ou rescindido a decisão condenatória.

Art. 169 - Prescreve em 2 (dois) anos a ação anulatória da decisão administrativa que denegar a restituição.

A interpretação dos referidos dispositivos tem gerado grande celeuma. Penso, como Leandro Paulsen, que “ aplica-se o prazo de dois anos em se tratando de pretensão  de repetição de valores cuja repetição já tenha sido indeferida administrativamente. Efetivamente, repetição  judicial, em tal situação, pressupõe  a anulação da decisão administrativa denegatória”(Direito Tributário, 12 ed, pág. 1151).

De fato, não há sentido em entender como anulatório puro o pleito baseado no artigo 169 do CTN. Ora, de que adianta anular a decisão administrativa se não houver a devolução do valor pago indevidamente? Seria a consagração do conhecido adágio “ganhou mas não levou”

É certo, existem alguns acórdãos mais antigos do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que os pleitos repetitório e anulatório seriam distintos, razão pela qual a opção administrativa do contribuinte em pedir a repetição  seria praticamente única, pois o art. 169 se destinaria a aspectos primordialmente formais. Acórdãos mais recentes tratam de compensação, que não é o mesmo que repetição.

A referida tese é de um fiscalismo extremo. É dar ao Estado a gostosa prerrogativa de controlar os prazos que tem contra si, bastando deixar transcorrer cinco anos desde o pagamento indevido e depois  indeferir o pleito administrativo. A tese de que a via judicial estaria desde o início aberta também não socorre tal argumento. Ora, a resolução dos problemas do Fisco dever ocorrer primordialmente por ele. O Judiciário é via subsidiária de solução de conflitos, e não principal.

Conclui-se, pois, que incide a regra geral de que,  enquanto pendente o pedido administrativo,  não corre prescrição, consagração do postulado da actio nata, no sentido de que não há pretensão  manejável se não há ciência da lesão. A única peculiaridade do Direito Tributário é o novo prazo de dois anos para o pleito judicial, mesmo que faltante  apenas um mês para a consumação do prazo quinquenal de repetição quando do pleito administrativo.

Há discussão, contudo, quando o pleito administrativo for feito em período menor e a soma do prazo já transcorrido com os dois anos do art. 169 do CTN for  inferior aos cinco anos do art.168 do CTN. Nesse ponto, há entendimento, com o qual não comungo, diante da especificidade do CTN, de que seria aplicada a Súmula nº 383 do STF, não podendo a  prescrição ficar reduzida aquém de cinco anos

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